Idealistas como eu, pessoas cujo a atuação social faz parte de sua própria existência, estão sempre envolvidos em tudo. Quando mais jovem, parecia que carregava o mundo nas costas, participava de tudo e toda a luta era minha luta. Com o tempo, com a chegada da idade, fui ficando mais seletivo e aí entra o dilema: Quais causas terão minha atenção?
Esse é um dilema para um idealista, pois, mudar o mundo é nossa "utopia", e mudar a partir do Brasil, um país com tantas imperfeições, injustiças e vulnerabilidades, é ainda mais difícil, pois, para todo o lado que olhamos há algo que mereça nossa atenção.
"90% das mortes no trânsito ocorrem em países de baixa e média renda"
Em alguns momentos isso dói demais, pois quando percebemos que não temos força e nem possibilidades de participar de todas as lutas que consideramos importantes, a frustração nos joga em um lugar de sofrimento. Pois, cremos que a vida só faz sentido quando ela serve para melhorar as coisas a nossa volta.
Entre as causas que me engajei está o Vida Urgente, programa da Fundação Thiago de Moraes Gonzaga, que atua na prevenção da vida no trânsito. Muitas vezes fui perguntado o porquê desta escolha, muito embora, para mim, ela fosse autoexplicativa, uma vez que não há nada mais importante a ser defendido do que a vida.
"Os acidentes nas vias custam aos países cerca de 3% de seus produtos internos brutos"
Eu poderia fazer uma lista de causas que receberam minha atenção, outras tantas que mereceriam minha atenção, causas defendidas por pessoas próximas que admiro. Tenho, por exemplo, uma filha envolvida com a causa animal e acompanho os sacrifícios e esforços que ela faz por eles.
Mas hoje, é sobre o Vida Urgente essa reflexão: A reportagem da Jornalista Flávia Cintra que foi aos EUA testar o exoesqueleto, veiculada no Fantástico do dia 02/07/2023 poderia funcionar como uma resposta para os que ainda tem dúvidas da relevância do trabalho que o Vida Urgente desenvolve e a importância de sua existência.
"Homens correm maior risco de morrer por acidentes de trânsito do que mulheres"
Repórter Flávia Cintra passa por experiência única com exoesqueleto: "Foi a primeira vez que eu andei em mais de 32 anos" Reportagem exibida no Programa FANTÁSTICO, da TV Globo, em 02/07/2023
Flávia Cintra repetia a experiência que a Senadora Mara Gabrilli (SP) havia vivido meses atrás podendo caminhar com um exoesqueleto.
Essa reportagem demonstra os esforços da ciência para proporcionar oportunidades a paraplégicos e tetraplégicos, mas, um fator me chamou especial atenção na história: O quê levou os personagens da reportagem a estarem em cadeiras de rodas?
Flávia Cintra: A jornalista, atualmente com 50 anos, ficou tetraplégica aos 18 anos, quando voltava para Santos, onde morava, pela rodovia Anchieta, e seu então namorado, que conduzia o veículo, foi desviar de corpo estendido no asfalto e acabou capotando o veículo. Quando o veículo parou, Flávia já não sentia mais seu corpo do pescoço para baixo. Presa às ferragens, passou por cirurgia e após um longo período de reabilitação, recuperou alguns movimentos das mãos e dos braços.
Mara Gabrilli - A Psicóloga, Publicitária de 55 anos, atualmente Senadora pelo Estado de São Paulo, poucos dias antes de completar 27 anos, no ano de 1994, fazia percurso entre Paraty (RJ) e à serra de Taubaté (SP). O condutor do veículo, seu então namorado, “estava correndo um pouquinho a mais do que deveria naquela estrada”, havia bebido antes da viagem e conhecia pouco o veículo que conduzia, então perdeu o controle e caiu a uns 15 metros, capotando em uma curva da serra de Taubaté chamada "curva da morte". Mara Gabrilli permaneceu 22 dias na UTI e ficou tetraplégica em decorrência do acidente.
Emerson Maia Damasceno - O advogado foi atropelado por um veículo enquanto realizava um treino de ciclismo, em março de 2014, na CE-040, no Ceará. À época, ele teve fratura na coluna, que resultou em uma paraplegia. Após a reabilitação no Hospital Sarah Kubitschek, ele começou a retornar às atividades físicas que praticava. Atualmente é paratleta, jornalista e presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-Ceará.
O caso deles me fez lembrar imediatamente do Adão Neto, o "Dango", um dos voluntários do Vida Urgente, a quem acompanho há muitos anos, e também ficou tetraplégico em uma “carona furada” (Abaixo reproduzo uma campanha que a Fundação Thiago Gonzaga criou com o seu depoimento). A estrutura que lhe é oferecida nestes quase 30 anos, não se compara às que Flávia e Mara tiveram acesso pela condição social de ambas, bem superior à do Dango, o que nos faz refletir o quão já é difícil para elas e o quanto torna-se difícil para ele e outros milhares de brasileiros.
"As lesões ocorridas no trânsito são a principal causa de morte entre crianças e jovens de 5 a 29 anos"
A reportagem me fez pensar também nos impactos dos sinistros de trânsito na minha vida. A começar pelo irmão caçula de meu pai, meu tio, que morreu atropelado ainda adolescente, na década de 70, quando eu era uma criança, o que impactou sobremaneira a família, principalmente minha avó, que acabou vindo a morrer tempos depois. Lembro também, de meu companheiro de movimento estudantil, Felipe, que sofreu um acidente fatal na década de 80 com o carro que era da UMESPA, impactando a todos nós na época, e daí em diante foram diversas situações vividas, como a própria perda do Thiago, jovem que conhecia, filho de meu querido e saudoso amigo Régis Gonzaga.
Enquanto assistia a reportagem refletia sobre o fato que passaram-se 32 anos anos para que a ciência conseguisse colocar a jornalista Flávia Cintra em pé novamente e que Mara Gabrilli levou duas décadas para conseguir recuperar um pouco dos movimentos das mãos, que lhe possibilitou conduzir uma cadeira de rodas motorizada. Pensei o quanto um segundo no trânsito pode mudar a vida das pessoas para sempre. Em nosso país os sinistros de trânsito são os maiores responsáveis por deixar pessoas tetraplégicas e paraplégicas. No passado, a maioria eram ocorrências envolvendo automóveis, como no caso de Flávia e Mara, atualmente as ocorrências envolvendo motocicletas se equiparam aos automóveis.
"Quase metade (49%) das pessoas que morrem nas vias em todo o mundo são pedestres, ciclistas e motociclistas"
Os impactos dos sinistros de trânsito, além das perdas de vidas, que são incalculáveis, custam bilhões de reais ao país, valor difícil de dimensionar, uma vez que envolvem desde os custos de socorro que é feito pelo sistema público, até o atendimento, tratamento e reabilitação, indenizações por danos materiais e pessoais, pensões por morte e invalidez e um infindável número de efeitos colaterais.
Assistindo a reportagem eu pensava no impacto positivo da Fundação Thiago de Moraes Gonzaga nesse contexto. Quantas vidas já foram salvas? Quantas pessoas deixaram de ser “condenadas” a viverem o resto de suas vidas em cadeiras de rodas?
Segundo dados da OMS (Organização Mundial de Saúde) os países como o nosso, gastam cerca de 3% de seus produtos internos brutos com os acidentes de trânsito (No Brasil seriam cerca de R$ 100 bilhões por ano se considerarmos o PIB de 2022). Se somarmos tudo que o Vida Urgente investiu em 27 anos de preservação da vida no trânsito, não chegaremos nem perto de 1% do que é gasto no SUS, por mês, para atender as vítimas do trânsito. O “custo” da prevenção é infinitamente menor do que o atendimento das consequências.
"Em todo o mundo, os sinistros de trânsito causam aproximadamente 1,3 milhão de mortes evitáveis e cerca de 50 milhões de feridos por ano"
Frequentemente me pego pensando: Que outra instituição no mundo fez o que a Fundação Thiago de Moraes Gonzaga fez através do VIDA URGENTE? O Vida Urgente nasce em um país entre os cinco que mais matam no mundo, um país onde o problema do trânsito é subestimado e que sempre recebeu pouca atenção dos governos e da sociedade em geral, mesmo assim, esse programa conseguiu conquistar o engajamento de milhares de jovens, em todo o país, jovens que teriam dezenas de outras possibilidades de engajamento voluntário, problemas sérios que mereceriam sua atenção, porém, optaram por lutar pela preservação da vida no trânsito, sensibilizados pelo Vida Urgente.
Que outra instituição mobilizou mais pessoas e fez o número de ações que o Vida Urgente realizou em suas mais de duas décadas de existência?
Diante dessa realidade, não há como ter dúvidas que esta causa é uma causa que vale a pena ser defendida. Cada movimento, cada ação, cada tostão investido na preservação, tem uma importância gigantesca para a sociedade. Um valor imaterial impossível de ser dimensionado, pois, não há como calcular o preço de uma vida. Não temos como calcular o valor da vida de um filho para seus pais e se pensarmos que, muito provavelmente, alguns pais só tenham seus filhos ao lado pela atuação do Vida Urgente que, com certeza, já preservou muitas vidas com sua atuação.
Obrigado Vida Urgente por ser a causa que orgulha!!
Obrigado Régis e Diza por essa iniciativa!!
Obrigado a todos que, das mais diversas formas, contribuíram e contribuem para essa linda história de relevantes serviços prestados à nossa sociedade!!
A Vida Agradece!!!
A Organização Mundial da Saúde e as Comissões Regionais das Nações Unidas, em cooperação com parceiros na Colaboração das Nações pela Segurança no Trânsito e outras partes interessadas, desenvolveram o PLANO GLOBAL como um documento de referência para dar apoio à implementação da Década de Ação Pela Segurança no Trânsito - 2021 - 2030 e seus objetivos. (Abaixo o documento para download)
Excelente! Deveria ser leitura obrigatória a todos.